Tunel do tempo...

Abelhando pela net, encontrei essa reportagem muito interessante, fazem uma comparação de Jesus (o Cristo) com um indio que estava protestando na missa dos 500 anos Jerry Adriani Santos de Jesus (o índio).

Não sou catolica, nem evangelica, mas gostei muito da reportagem. Coloquei com a tag "Tunel do tempo..." porque a notícia é do ano 2000 (não sabia até o momento.)



Jesus de ontem...
...Jesus de hoje


Um índio invadiu a Missa dos 500 anos. Diz o noticiário que foi de surpresa, contrariando a orientação do Vaticano que não queria a politização da cerimônia. E fez um discurso: ‘Quinhentos anos de sofrimento, de massacre, de exclusão, de preconceito, de exploração, de extermínio de nossos parentes, aculturamento, estupro de nossas mulheres, devastação de nossas terras, de nossas matas, que nos tomaram com a invasão. Hoje, querem afirmar a qualquer custo a mentira, a mentira do Descobrimento. Cravando em nossa terra uma cruz de metal, levando o nosso monumento, que seria a resistência dos POVOS indígenas. Símbolo da nossa resistência e do nosso povo. Estamos de luto. Até quando?”

O bispo D. Geraldo Lyrio Rocha, responsável pela comissão da CNBB que organizou o evento, declarou: “Foi um ato espontâneo e inesperado, mas a CNBB não viu isso como um ato de afronta.”

O nome do índio ficou meio escondido: Jerry Adriani Santos de Jesus. Diz um jornal : “Acompanhado por índios vestidos a caráter e carregando uma faixa preta, Jesus, conhecido como Matalauê...”.
 
Para os cristãos, em especial os católicos, a missa é a celebração em memória do Jesus de ontem, “conhecido como o Rei dos Judeus”, como Pilatos sugeriu fosse colocado na inscrição no alto da cruz.

O índio pataxó, na indignação e santa ira, ‘invadiu’ o memorial do sacrifício de dois mil anos atrás para protestar contra o sacrifício dos últimos 500 anos. Como disse Matalaué, o Jesus de hoje: “Vocês, quando chegaram aqui, essa terra já era nossa. O que vocês fazem com a gente? Nossos povos têm muitas histórias para contar. Nossos povos nativos de donos desta terra, que vivem em harmonia com a natureza: tupi, xavante, tapuia, caiapó, pataxó e tantos outros. São mais de 40 mil anos em que germinaram mais de 990 povos com culturas, com línguas diferentes, mas apenas em 500 anos esses 999 povos foram reduzidos a menos de 220. Mais de 6 milhões de índios foram reduzidos a apenas 350 mil.”

Os dois Jesus se encontraram. O de dois séculos atrás, jogado na cruz pela intolerância, pelo novo que trazia, pela palavra vivida, pela opção pelos pobres e deserdados: “Amai-vos uns aos outros. Toda vez que o fizerdes ao menor dos meus irmãos, é a mim que o fazeis”. E o de hoje: “Com o nosso sangue, comemoram mais uma vez o Descobrimento.” O poder subversivo dos de baixo e da libertação enfrentou e enfrenta o ‘status quo’, a estrutura eclesial estabelecida e a aliança com os poderosos do tempo.

A memória se atualiza, torna-se presença e vida. Com o mesmo nome, ainda que emprestado ou imposto. Não é o sacrifício de ontem, mas o sacrifício de hoje: indígenas, desempregados, sem-terras, sem-teto. Não basta celebrar e recordar o passado. Nem simplesmente pedir perdão. 

“Vocês não se envergonham dessa memória que está na nossa alma e no nosso coração, e vamos recontá-la por justiça, terra e liberdade”, disse o Jesus de hoje, aliás, Matalauê.

Disse tudo. Aliás, como diria, com certeza, o Jesus de ontem.

Selvino Heck - CAMP - Centro de Assessoria Multiprofissional - 28.04.2000

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